Entre as várias ações de farmácias e drogarias que refletem sua responsabilidade com a saúde e o bem-estar geral, está o descarte de medicamentos.
O procedimento integra uma série de cuidados referentes ao uso racional de medicamentos, tirando medicamentos vencidos de circulação e reduzindo o risco de intoxicações.
Mas além de proteger indivíduos expostos à medicação vencida, há também uma preocupação com o meio-ambiente e sua contaminação pelas substâncias químicas presentes nos fármacos.
Cada quilo de medicamento descartado incorretamente pode contaminar até 450 mil litros de água, afetando significativamente a fauna e a flora locais, ou mesmo humanos.
E não é pouco o lixo produzido pela indústria farmacêutica ou serviços de saúde, considerando-se que, segundo o CRF-PR, o Brasil é o sétimo país que mais consome medicamentos no mundo.
Em 2019, foram recolhidas 130 toneladas de resíduos de medicamentos e embalagens somente nas redes da Abrafarma — que representam 43,7% do mercado total de medicamentos no Brasil.
Assim, percebe-se a importância de haver um controle sobre o descarte de medicamentos.
A seguir, você conhece a legislação sobre o assunto, novas medidas que estão sendo tomadas e de que forma sua farmácia precisa fazer sua parte.
O papel da farmácia no descarte de medicamentos
Assim como qualquer instituição que gera RSS — resíduos de serviços de saúde — as farmácias estão obrigadas por lei a proceder corretamente no descarte de medicamentos.
O documento que dispõe sobre as boas práticas de gerenciamento de resíduos é a RDC 222/18, onde se define cada etapa do descarte correto.
A resolução determina que todo estabelecimento farmacêutico apresente em seu primeiro semestre de funcionamento um Plano de Gerenciamento de Resíduos de Serviços de Saúde (PGRSS).
Além disso, classifica os 5 grupos de RSS e dá especificações sobre o manejo de cada um deles até a sua destinação final.
Para manter-se em dia com os procedimentos corretos de descarte de medicamentos conforme a Anvisa, seu primeiro passo é conhecer os 5 tipos de resíduos.
Os 5 grupos de RSS
A classificação dos resíduos de serviços de saúde foi feita a partir de suas características particulares e potenciais riscos à saúde e ao meio-ambiente.
Foram definidos 5 grupos, associados, cada um, a uma imagem padrão que serve para identificá-los ao longo de todo o processo de descarte.
Conheça abaixo os 5 grupos e suas imagens correspondentes:
Os resíduos do Grupo A são os infectantes, incluindo luvas, máscaras, toucas, jalecos descartáveis e propé, além de todo algodão usado para antissepsia. Devem ser identificados assim:
O Grupo B compreende os resíduos químicos, com maiores riscos à saúde e ao meio-ambiente, demandando cuidados mais complexos em todas as etapas do descarte.
Incluem medicamentos vencidos, interditados ou não utilizados e papéis utilizados durante a manipulação de formulações, além de produtos tóxicos, corrosivos, inflamáveis ou reativos.
Os resíduos do Grupo C são os radioativos, representados pelo símbolo internacional de presença de radiação ionizante:
O Grupo D engloba todos os resíduos comuns, que podem ser recicláveis (papel, plástico, alumínio, etc.) ou não recicláveis (restos de alimentos, papel higiênico, etc.).
O símbolo abaixo identifica os recicláveis em geral, enquanto o dos não recicláveis acrescenta um círculo ao seu redor e uma faixa diagonal sobre ele.
Já os resíduos do Grupo E são os perfurocortantes, como seringas com agulha, vidro quebrado ou lancetas. São identificados pela seguinte imagem:
Conheça cada etapa do descarte
O conjunto das etapas de descarte dos RSS é chamado de manejo, incluindo a segregação, acondicionamento, armazenamento, coleta, transporte, tratamento e destinação final.
No vídeo a seguir, você confere uma boa apresentação de todo esse processo em palestra da engenheira sanitarista e ambiental Denise Maria dos Santos Lopes:
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A seguir, você confere mais detalhes sobre cada uma das etapas do manejo.
Segregação
A primeira etapa é segregar os RSS conforme suas características físicas, químicas e biológicas, seu estado físico e os riscos envolvidos.
Um dos principais aspectos a se observar na segregação de resíduos do Grupo B, que engloba todos os medicamentos, é a periculosidade de cada substância.
A rotulagem e identificação desses resíduos deverá informar sobre características dos produtos como inflamabilidade, corrosividade, reatividade, toxicidade, carcinogenicidade, mutagenicidade etc.
Também é preciso segregar medicamentos que contenham produtos hormonais e antimicrobianos, citostáticos, antineoplásicos, imunossupressores, digitálicos, imunomoduladores e antirretrovirais.
Nesta etapa, ainda, é preciso considerar o estado físico (líquido ou sólido) e a compatibilidade química entre as substâncias que serão acondicionadas.
Os Anexos III a V da RDC 222/18 apresentam substâncias que devem ser isoladas, as que são incompatíveis entre si e as incompatíveis com embalagens de PEAD.
Acondicionamento e identificação
O acondicionamento dos resíduos químicos deve ser feito em recipientes de material rígido, resistente e compatível com as características do produto.
E ainda, os recipientes de substâncias líquidas precisam ser estanques e com tampa.
Vale destacar aqui que as embalagens primárias dos medicamentos devem receber a mesma destinação dos produtos que elas envolvem.
Embalagem primária é aquela que entra em contato direto com o medicamento, e deve sempre ser considerada contaminada pelas substâncias componentes da droga.
Assim, as embalagens de químicos perigosos precisam ser acondicionadas junto com os medicamentos em material rígido, resistente e compatível com as substâncias.
A cada um desses recipientes usados para acondicionar resíduos químicos será preciso anexar uma Ficha de Informações de Segurança de Produtos Químicos (FISPQ), contendo:
- Identificação do produto e da empresa
- Identificação de perigos
- Composição e informação sobre os ingredientes
- Medidas de primeiros socorros
- Medidas de combate a incêndio
- Medidas de controle para derramamento ou vazamento
- Manuseio e armazenamento
- Controle de exposição e proteção individual
- Propriedades físicas e químicas
- Estabilidade e reatividade
Armazenamento e tratamento
Estabelecimentos geradores de resíduos, como farmácias e drogarias, podem fazer o armazenamento primário no próprio local, desde que atendendo à legislação.
Em todos os casos, o local deverá sempre ser identificado com um cartaz ou placa dizendo “Abrigo temporário de resíduos”.
O local de armazenamento de resíduos do grupo A, D e E pode ser compartilhado.
O do grupo C deve obedecer ao Plano de Proteção Radiológica do serviço, normas da CNEN e outras normas aplicáveis.
Já o armazenamento externo ou secundário dos resíduos do Grupo B deve segregar conforme as categorias de químicos e incompatibilidades apresentadas pela RDC 222/18.
Resíduos líquidos devem possuir uma caixa de retenção e canaletas para contenção de eventuais vazamentos.
Além disso, o abrigo precisa ter um sistema elétrico e de combate a incêndio, atendendo aos requisitos de proteção estabelecidos pelos órgãos competentes.
Transporte e tratamento
Os veículos e recipientes utilizados para transporte de resíduos químicos deverão sempre apresentar a imagem de identificação dos RSS do Grupo B.
Em alguns casos, para reduzir os riscos durante transporte interno ou externo, será necessário fazer o tratamento das substâncias.
Os sistemas de tratamento de RSS são objeto de licença ambiental e podem sofrer fiscalizações de órgãos da Vigilância Sanitária e do Meio Ambiente.
Ainda assim, é possível que o tratamento seja feito no próprio local em que o resíduo foi gerado.
Mas em geral, as unidades de saúde precisam contratar empresas licenciadas pelo órgão ambiental para transporte, tratamento e destinação final do resíduo químico.
Porém, vale destacar que essa logística se aplica somente aos resíduos químicos gerados pela própria unidade.
A nova legislação de que trataremos a seguir acrescenta outras disposições sobre o transporte de medicamentos de uso doméstico descartados em farmácias pela população.
Destinação final
A destinação final dos resíduos químicos perigosos são aterros especiais, classificados como aterros Classe I.
Já as substâncias menos perigosas podem ir para aterros comuns de lixo domiciliar.
Líquidos de menor risco podem ser despejados em redes de esgoto com coleta e tratamento, ou então fossa, filtro ou sumidouro licenciado pelo órgão ambiental.
Para medicamentos descartados pela população, conforme a nova legislação, a destinação final prioritária é a incineração, seguida do coprocessamento e aterro para produtos perigosos.
A nova legislação para o descarte de medicamentos
O Decreto 10.388 de 2020 estabelece um sistema de logística reversa para coleta e descarte de medicamentos vencidos ou em desuso.
Assim, estende à indústria farmacêutica a mesma legislação que já se aplicava a fabricantes de pilhas, pneus, agrotóxicos e outros produtos que geram resíduos tóxicos.
Tal legislação consta da Lei 12.305, de 2010, e o Decreto de 2020 especifica como a logística reversa se aplica ao descarte de medicamentos.
Ele estabelece que, no mínimo, para cada 10 mil habitantes, deve haver uma farmácia operando como ponto de coleta de medicamentos vencidos ou em desuso.
O prazo para implantar isso é de 2 anos para as capitais e cidades com mais de 500 mil habitantes e de 5 anos para cidades com mais de 100 mil habitantes.
As cidades menores, que ainda não têm a estrutura adequada, como aterro ou incineração, ainda serão objeto de uma legislação futura.
Mas naquelas onde onde o Decreto já está em vigência, farmácias e drogarias deverão participar orientando a população e eventualmente disponibilizando contentores para descarte.
A partir daí, é responsabilidade dos distribuidores de medicamentos fazer a coleta e o transporte dos medicamentos descartados do abrigo primário para o secundário.
Depois disso, cabe aos fabricantes e importadores realizarem o transporte dos resíduos até a unidade de tratamento e destinação final ambientalmente adequada.
Mas é importante ressaltar que essa logística reversa se aplica somente a medicamentos de uso doméstico descartados pelo consumidor nos pontos de recebimento.
Onde descartar medicamentos vencidos?
A população em geral deve fazer o descarte de medicamentos vencidos em pontos fixos de recebimento ou nos pontos de coleta definidos em eventuais campanhas.
Conforme a nova legislação, os pontos de recebimento serão farmácias e drogarias, que a partir de então devem disponibilizar contentores com a frase: “Descarte aqui os medicamentos domiciliares vencidos ou em desuso”.
Porém, trata-se de uma legislação muito nova, com prazo ainda em aberto para cidades de médio porte e que não se aplica a cidades pequenas.
Assim, em geral, essas cidades seguem legislações próprias, sendo preciso consultar localmente onde são feitos os descartes.
Podem ser pontos de recebimento: farmácias, hospitais, postos de saúde, supermercados e até mesmo postos da iniciativa privada.
O Programa Descarte Consciente oferece um mecanismo para localizar o ponto de recebimento mais próximo conforme o seu CEP.
Conclusão: faça o descarte de medicamentos de forma responsável
Agora, você conhece em detalhes o processo de descarte de medicamentos, desde a sua segregação até a destinação final.
É um processo delicado e que deve ser feito de forma cuidadosa, pois envolve substâncias que representam risco à saúde humana e ao meio-ambiente.
Um ponto importante desse processo é a compreensão de que as embalagens primárias dos medicamentos devem receber o mesmo tratamento que as substâncias deles.
Mas você sabe exatamente quais são as embalagens primárias e quais outros tipos existem?
Para entender tudo também sobre esse assunto, clique no botão abaixo e confira o nosso artigo sobre embalagens de medicamentos!
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